Wednesday, January 12, 2011

notas de uma bela obra.

O homem gosta de criar e de abrir caminhos, isto é indiscutível. Mas por que ele também ama com paixão a destruição e o caos? Digam-me, por favor! Entretanto, eu mesmo quero dizer duas palavras à parte sobre isso. Não poderia ser, talvez, que ele ame tanto a destruição e o caos (bem, é indiscutível que ele às vezes gosta muito, não há dúvida) porque ele mesmo, instintivamente, teme atingir o objetivo de concluir o edifício que estava construindo? Como os senhores podem saber? Talvez ele ame o edifício somente de longe e não o ame de perto; talvez ele ame apenas o ato de construí-lo, e não viver nele, abandonando-o depois aos animaux domestiques, como formigas, cerneiros, etc. Vejam como as formigas têm um gosto completamente diferente. Elas têm edifícios extraordinários, indestrutíveis para os séculos: os formigueiros.
As veneráveis formigas começaram com um formigueiro e terminarão também, provavelmente, com um formigueiro, o que muito honra sua constância e sua natureza positiva. Mas o homem é um ser inconstante e pouco honesto e, talvez, à semelhança do jogador de xadrez, goste apenas do processo de procurar atingir um objetivo, e não do objetivo em si. E quem sabe? Não se pode garantir, mas talvez todo o objetivo a que o homem se dirige na Terra se resuma a esse processo constante de buscar conquistar ou, em outras palavras, à própria vida, e não ao objetivo exatamente, o qual, evidentemente, não deve passar de dois e dois são quatro, ou seja, uma fórmula, e dois e dois são quatro já não é vida, senhores, mas o começo da morte. Pelo menos, o homem sempre teve um certo temor desse dois e dois são quatro, e eu até agora tenho. Suponhamos que o homem não faça outra coisa além de procurar esse dois e dois são quatro, atravessando oceanos, sacrificando a vida nessa busca, mas sou capaz de jurar que ele tem medo de encontrá-lo realmente. Porque ele sente que, assim que o encontrar, não haverá nada mais para procurar.

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Pois chegamos ao ponto de quase achar que a verdadeira "vida viva" é um trabalho, quase um emprego, e todos nós no íntimo pensamos que nos livros é melhor. E por que às vezes ficamos irriquietos, inventamos caprichos? E o que pedimos? Nós mesmos não sabemos. Nós mesmos nos sentiremos pior se nossos pedidos delirantes forem atendidos. Pois bem, façam uma experiência, dêem-nos, por exemplo, mais independência, desamarrem as mãos de qualquer um de nós, ampliem nossa esfera de ação, relaxem a tutela e nós... eu lhes asseguro: nós imediatamente pediremos a volta da tutela. Sei que os senhores talvez fiquem bravos comigo, comecem a gritar e bater os pés: "Fale somente sobre si mesmo e sobre suas misérias no subsolo, mas não ouse dizer todos nós". Permitam-me, senhores, eu não estou me justificando quando digo todos. E no que me diz respeito, eu apenas levei às últimas consequências na minha vida aquilo que os senhores não tiveram coragem de levar nem à metade, e ainda por cima acharam que sua covardia era bom senso, consolando-se e enganando a sí próprios com isso. De modo que talvez eu esteja mais "vivo" que os senhores.

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E de fato agora eu mesmo estou colocando uma questão ociosa: é melhor uma felicidade barata ou um sofrimento elevado? Então, o que é melhor?

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Destruam meus desejos, apaguem meus ideais, mostrem-me alguma coisa melhor, e serei seu seguidor. Talvez os senhores digam que não vale a pena meter-se comigo; nesse caso, posso responder-lhes da mesma forma. Estamos argumentando seriamente, mas, se não quiserem conceder-me sua atenção, não hei de me humilhar. Tenho meu subsolo.

Fiódor Dostoiévski, Notas do Subsolo

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